sexta-feira, 29 de novembro de 2013

CADA UM NO SEU QUADRADO

Deve-se ter em mente que não há nada mais difícil de executar, nem de sucesso mais duvidoso, nem mais perigoso de se conduzir, do que iniciar uma nova ordem de coisas”. José Sydney Ipiranga Parei de escrever artigos de opinião há praticamente dois anos, no fim de 2011. O pleito municipal em outubro de 2012 era um vasto campo de assuntos, grande oportunidade, mas confesso que não estava nem um pouco “a fim...”. Na época dei um tempo até mesmo no meu “face”. Só estou escrevendo agora por uma quase obrigação profissional. Mas confesso que rebater oportunistas manipuladores a serviço da especulação também me motiva. Mas não vou fazê-lo com discurso, quero mostrar também alguns números. Vou tentar um amalgama entre o técnico e político, esse no sentido macro, não essa partidária, mesquinha, que “in” felizmente sou cético. Vou falar sobre o IPTU - Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, o assunto da moda, mas precisamos falar também sobre a cidade que temos e a que queremos. Um amigo me disse que se eu conseguisse convencer alguém que pagar imposto é bom o Edir Macedo me contrataria na hora. Mas já adianto que não tenho a menor intenção de convencer ninguém disso (isso aqui é Brasil), como também não quero trabalhar pro “Bispo Macedo”. A Lei 5172 de 1966 dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Dentre outras sobre o IPTU: “o imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município”. No art. 33 estabelece que “a base do cálculo do imposto é o valor venal do imóvel”. Venal aqui tem o significado de “vendável, que se pode vender”. A lei municipal em nada difere disso e determina que “o valor venal do imóvel, para efeito de cálculo do imposto, será determinado pelo valor venal do terreno, para os imóveis territoriais, e pela soma dos valores venais do terreno e da construção, para os imóveis prediais”. Muito fácil de ser entendido. Hoje o IPTU da cidade de Passos apresenta apenas duas alíquotas: 0,5 % para imóveis construídos e 1% para imóveis não construídos. O valor venal dos imóveis está baseado numa planta genérica de valores de 17 anos atrás. O tão falado aumento de IPTU seria uma pura e simples mudança de alíquota. Por exemplo, poderiam ser propostos os índices de São Sebastião do Paraíso: 2,3 % para terrenos e 0,7% para construídos (não é Paraíso o Paraíso de muitos por aqui). Mas isso não traria nenhuma justiça tributária, pois a valorização dos imóveis nestes últimos 17 anos não aconteceu de forma linear. As várias regiões da cidade se valorizaram de forma distinta. O próprio investimento especulativo e até a atuação do setor público não se deu igualmente por toda cidade. A opção foi por uma atualização da planta genérica de valores. A atual não pode ser vista nem como irreal, pois não se tem nenhum parâmetro, é algo digamos surreal. Terrenos de 100 mil reais tributados por 6... 7... no máximo 8 mil reais. Casas de 400 mil por 60 e assim por diante. O valor venal de um apartamento no prédio mais “glamoroso” da cidade é de 127 mil reais, sendo sobre esses valores que se cobra o IPTU. Você acredita que quem está trabalhando pela manutenção dessa situação está a favor dos menos favorecidos? Se ainda tem dúvida, continue lendo... Desafio uma pessoa sequer a colocar a venda seu imóvel pelo dobro do que aparece no seu carnê de IPTU como valor venal. Mas uma nova planta genérica de valores já havia sido tentada antes. Visando não cometer os erros anteriores algumas significativas mudanças foram feitas. Primeiramente se optou por contratar uma empresa especializada para levantar o valor do metro quadrado de todas as vias, seccionando-as quando necessário. A única intervenção veio no sentido de que fossem os valores em que realmente os imóveis são vendidos e não o que é pedido. Nenhum valor apresentado foi contestado. Mesmo assim, a proposta foi que a nova planta de valores fosse implantada em 5 anos (20 % da diferença para a atual por ano). Para a composição do valor venal do imóvel no caso dos construídos temos o valor do metro quadrado da construção. O indexador deste foi o do Custo Unitário Básico de Construção (CUB/m²), do Sindicato da Indústria da Construção Civil de MG, calculado de acordo com a Lei Fed. nº. 4.591 e a Norma Técnica NBR 12.721:2006 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). O valor submetido à apreciação da Câmara Municipal foi o de R$ 1.080,00 (valor do padrão baixo). Hoje todos sabem que o metro quadrado construído não fica abaixo disso. Ante ao que foi falado até aqui, a Câmara Municipal já adiantou no mínimo duas alterações na lei. A primeira diz respeito ao prazo da implantação da planta genérica de valores, de 5 para 10 anos (10 % da diferença para a atual por ano). A segunda é o valor do metro quadrado construído de R$ 1.080,00 para R$ 540,00, ou seja, a metade do valor e o dobro do tempo para aplicação da nova planta genérica de valores. Particularmente eu gosto dessa extensão do tempo. A “reconstrução” da cidade, que passa pela recuperação financeira da administração municipal tem que ser pensada mesmo a médio e longo prazo. Particularmente sou a favor dos 10 anos, o que faz com que passemos por outras duas gestões, tirando a visão partidária do projeto e trazendo a de cidade. Na verdade, seria no meio da terceira gestão a contar dessa que teríamos os valores na casa dos 70% do valor real do imóvel (em 2023). Essa margem de segurança também é interessante, pois fica por conta de uma possível “bolha imobiliária” que vem sendo levantada por especialistas e que por aqui nos parece bem possível. A lei enviada à Câmara traz ainda outras mudanças: Comissão permanente para avaliação do valor venal dos imóveis em caso de dúvidas dos contribuintes; Divisão do IPTU em até 10 vezes; Criação do bônus (bom pagador) para os imóveis que não apresentam dívida (5% de desconto para a inscrição cadastral que não apresentar dívida ativa até a data do lançamento do IPTU); Desconto de 5% para pagamento à vista. Existe hoje na cidade um ano de IPTU de dívida, na maioria dos grandes devedores. Além disso, tem a criação de alíquota social (0,25%), o que efetivamente representaria um desconto de 50 % em relação ao valor normal, para contribuintes de baixa renda, tais como: Aposentados, viúvas e portadores de necessidades especiais com apenas 1 salário mínimo e um único imóvel; Moradores das áreas definidas como ZEIS – Zonas Especiais de Interesse Social (já definidas por lei). Igualmente a criação de alíquota para área de interesse coletivo (0,25%) para terrenos usados para estacionamento aberto de atendimento ao público em áreas definidas como de interesse pelo poder público, na região central e/ou de grande concentração comercial e/ou prestação de serviços. Outra emenda interessante feita pelos vereadores garante o mesmo desconto para moradores de vias sem calçamento. Isso sim é ação de vereador. Depois disso, ainda dá pra acreditar que quem está trabalhando pela conservação da situação atual está a favor dos menos favorecidos? Sobre alíquota ainda, existe uma lei já aprovada que determina que o imóvel comercial / prestação de serviço / indústria pague 2% de IPTU. Não sei por que isso nunca foi aplicado, mas Passos tem dessas coisas. O projeto foi pela redução para 1%, mas como sempre se cobrou o mesmo que o residencial, os vereadores optaram por se manter assim. Confesso que gostei também dessa ação, mesmo entendendo que existe diferença quanto ao impacto desses, muito maior que um imóvel residencial, porém, até para o “Cadastro Municipal” isso seria bem complicado. Além do mais, com isso os vereadores retiram um dos palanques armados em torno do projeto. Com relação a isso eu tenho uma visão muito democrática: “faz parte...” (#kdpalanquetavaki). Quando o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, voltou atrás em relação aos 20 centavos do aumento transporte público fiquei pensando como ele iria resolver a questão, pois o mesmo funciona sob regime de concessão. Não existe milagre, pouco tempo depois veio o IPTU pra subsidiar o transporte coletivo e pronto, fecharam as contas e ainda deve sobrar dinheiro por lá (#ptquietinho). Neste meio tempo as manifestações já estavam praticamente implodidas, com boa parte da opinião pública contrária por causa da “violência”. Por aqui a coisa não é muito diferente, a partir de janeiro de 2014 o transporte coletivo passa a ter um subsídio em torno de 60 mil por mês, mais uma herança. Além disso, existe uma dívida com a Empresa Cisne de cerca de 1 milhão de reais. Acredito que o restaurante popular só irá funcionar se subsidiado também, assim como acontece em Poços de Caldas, onde as pessoas pagam R$ 2,00 e a prefeitura “banca” outros R$ 2,19 por refeição. Abro um parênteses para mostrar um quadro comparativo da cidade de Passos com outras duas (uma maior e outra menor), aqui podemos notar a enorme disparidade em relação a arrecadação municipal no que se refere ao IPTU: Cidade - Nº de Imóveis - População - IPTU 2013 - Média/Imóveis - Média/População. Uberaba - 145.809 - 295.988 - R$ 56.598.645,35 - R$ 388,16 - R$ 191,21 Alfenas - 41.451 - 73.774 - R$ 16.253.180,33 - R$ 392,10 - R$ 220,31 Passos - 47.763 - 106.290 - R$ 8.197.870,09 - R$ 171,64 - R$ 77,12 Falando-se em arrecadação, a do município de Passos pra 2013 está estimada em torno dos 137 milhões (toda), R$ 1.280,00 por habitantes, ou, R$ 106,00 habitante/mês. Para que a cidade fosse como esperamos (sabe aquela cidade que quando visitamos saímos encantados com os parques, jardins, a limpeza e calçamento, tudo muito bem cuidado), a arrecadação necessitaria ser pelo menos R$ 2.000,00 “per capita” ano, sem a eterna dependência de governo estadual ou federal, sempre incertos e cada vez mais escassos, pelo menos pra nós, os últimos a sermos lembrados, vide estadualização da FESP, Trevo da Arlindo (MG-050) e etc. Dentro dos objetivos de um modelo de gestão pública eficaz vemos a necessidade de: “Aumento da capacidade de investimento com recursos próprios; Garantia do equilíbrio fiscal de forma sustentável; Cumprimento sistemático de metas financeiras e fiscais; Elevação da capacidade de resposta do Governo Municipal às demandas socioeconômicas e ambientais, pelo aperfeiçoamento de modelos, métodos, técnicas e mudanças comportamentais; Compatibilizar o tamanho do Município a real capacidade econômica e financeira; Promover o desenvolvimento técnico e gerencial dos servidores municipais e o uso intensivo de recursos tecnológicos”. Muito pouco disso vemos hoje na nossa cidade. A administração pública em Passos não acompanha o crescimento e importância de cidade. Existem aqueles que vão dizer que falta competência, gestão e etc. É assim que pensava também boa parte das pessoas que passaram pela administração municipal nas últimas décadas, e não foram poucos. Muitos quando estão do lado de fora ainda aproveitam desse discurso, mas quando fazem parte da administração municipal... Tivemos um secretário que disse que “a prefeitura é um cemitério de sonhos”. Quando trabalhava numa fortíssima estatal ele pensava e executava. Na prefeitura, na primeira oportunidade pediu o boné e foi embora. São inúmeros projetos que acabam engavetados por falta de recursos para serem viabilizados. Num exercício de memória levantei alguns nomes que passaram por três importantes secretarias municipais, responsáveis por setores vitais para a qualidade da cidade: Planejamento, Indústria e Comércio; Saúde: Secretários de Planejamento: Roque Piantino, Gilberto Almeida, Fábio Pimenta Esper Kallas, Jose Donizete de Melo (i.m), Dr. Luiz Carlos Lima Reis, Dr. Jose Orlando - Tuta, Toninho Pastor... Secretários de Indústria e Comércio; Wanilton Cardoso Chagas, Antonio de Faria, Renatinho Ourives, Jose Geraldo Lopes Silveira, Samir Miguel Hadad... Secretários de Saúde: Dr. Gilberto Kirchiner, Dr. Demis Delfraro, Dr. Jose Orlando - Tuta, Dr. Luiz Carlos Lima Reis, Gilberto Cançado - Betaca, Ricardo Magalhães Silveira, Dr. Cleiton Piotto, Maurício Vilela Reis.. Será que a todos esses faltou competência?... Indo para minhas considerações finais, quero trazer também alguns números da última gestão municipal. Foi dito pelo Secretário de Fazenda do primeiro mandato do atual prefeito que a prefeitura tinha sido entregue na época com 5 milhões em caixa, fato nunca negado. Também não existia dívida para com os funcionários públicos. Outro número que não foi desmentido é o da dívida deixada agora, praticamente 15 milhões. Ou seja, o mandato que se encerrou no final do ano passado gastou algo em torno de 20 milhões a mais do que arrecadou, isso pra aquele nível de administração (não estou fazendo nenhum juízo de valor, mesmo porque isso já foi feito na eleição). Desta forma, a necessidade da nova planta genérica de valores deveria ser vista pela oposição, que boa parte dela participou do último mandato na cidade, como um “álibi”. Dos últimos três prefeitos que estiveram à frente do nosso município, não estou falando de gestão, mas sim de prefeitos, dois deles saíram sem pagar o mês de dezembro, o 13º do funcionalismo público, parte das férias, além dos empenhos cancelados e restos a pagar. A recuperação financeira do município, onde o IPTU deve ser só o começo, torna-se vital neste momento. É certo que outras ações são necessárias. Até mesmo uma maior fiscalização e atualização cadastral (que está sendo feita) são necessárias. Mas dizer que está tudo bem, quando trabalhamos num prédio que já devia ter sido interditado, sob condições muito ruins, instabilidade quanto a recebimento do salário, férias, 13º, todo ano, isso é demais. Um único concurso público em mais de 10 anos. O salário de entrada de um diretor de departamento municipal em Passos hoje é de R$ 2.592,36 e de um chefe de divisão é de R$ 1.960,22. Estamos falando de cargos de chefia. Outra fala comum é a de “quem garante que o dinheiro será bem empregado?”. Mas caso isso não ocorra, temos o Ministério Público (atuante quando “motivado”) e a própria Câmara Municipal, sendo a fiscalização uma de suas atribuições mais importantes. De tudo, nos sobra a certeza das eleições, de 4 em 4 anos temos essas pra mudar quem está a frente da administração caso não satisfaça a maioria da população. O que não dá mais é essa situação, totalmente favorável a especulação, aos mais favorecidos, que dependem muito pouco do serviço público. Proliferam os condomínios verticais e horizontais, na “pseudo” sensação de segurança. Cada um no seu quadrado...
Alguém ainda acredita mesmo que quem está trabalhando pela manutenção da situação atual está a favor dos menos favorecidos? #papainoelexiste

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